Viver na claridade de Deus*
Continuamos nossa caminhada quaresmal celebrando o Quarto Domingo da Quaresma, o chamado Domingo da Alegria. A Quaresma é um tempo favorável para avaliarmos a nossa caminhada de cristãos, e um convite que passa por algumas etapas: as tentações que enfrentamos (I domingo), as experiências que fazemos de Deus (II Domingo), a bebermos da Água que jorra para a vida eterna (III Domingo), e neste Domingo, a cura do cego de nascença, que também são nossas cegueiras.
As leituras deste domingo nos remetem à luz que vem de Deus. Mas, qual é a sua intensidade? Quais são as escuridões que, a Palavra de Deus, tem por finalidade clarear?
A primeira leitura (1 Sm 16, 1.6-7.10-13) apresenta os critérios com os quais Deus nos julga. Ele não olha as aparências, nem as estaturas, mas o nosso coração, e este, agradando-Lhe ungi, consagra para uma missão.
A segunda leitura (Ef 5, 8-14) Paulo nos convida a vivermos como filhos da luz. E como se vive? Ser filho da luz é ter um coração bom. É ser uma pessoa iluminado, como diz o ditado popular. Os seus frutos são sempre de bondade, justiça, verdade (v. 9) e a sua escuridão não é sinônimo de vergonha, nem de segredo.
Qual a diferença, então, entre o homem da luz e o homem das trevas? o homem do dia e o homem da noite? o homem que enxerga e o homem que é cego? o Evangelho (Jo 9, 1-41) nos mostra. Primeiro Jesus não escolhe, mas ambos são acolhidos por Ele nas suas diferenças. No entanto, o homem da luz é aquele que se deixa ser alcançado e tocado por Jesus em sua escuridão, no seu estado de pecado; que faz o pedido d’Ele (v.7); que não se esconde por traz de máscaras, nem de imagens, e não tem receio de seu passado (v.9); que conta a história de sua conversão e a sua libertação quantas vezes for preciso (v. 11. 15. 27); assume as suas responsabilidades e conseqüências e, por último, passa acreditar em Deus não apenas porque foi por Ele achado, mas porque a sua fé o levou a testemunhar a luz da graça em sua vida e exclamar: eu creio, Senhor (v. 38).
E o homem das trevas, da noite, da cegueira, como o conhecemos? gosta muito das aparências, como fala a segunda leitura; age no segredo, de tal modo que faz até vergonha contar seus feitos; suas ações são sempre mapeadas e executadas na “noite” do tempo, ou seja, longe da presença da luz de Cristo. Judas ao trair Jesus saiu, diz São João e, que horas?... era noite (Jo 13, 30), isto é, no poder das trevas, da escuridão, da cegueira de não querer enxergar Cristo como único salvador; o homem da escuridão não enxerga o outro como irmão, de tal forma, que o cego de nascença do Evangelho não era conhecido pelos judeus, pois era um mendigo que pedia esmola nas proximidades do templo e, todos os dias, por mais de uma vez eles iam para fazer suas orações, mas nem se quer percebiam aquele cego.
O homem das trevas não acredita que Deus pode fazer maravilhas; vive preso na sua própria lei e, por isso, quer ter provas. Para ele, a verdade nunca é plena, mas provada, precisa de testemunhas para averiguar o caso. Será que nos dias de hoje temos casos assim?
A liturgia deste Quarto Domingo da Quaresma nos dá uma lição de vida prática. Na verdade, Deus não quer que continuemos vivendo em nossas cegueiras, mas nos quer iluminar, nos quer voltados para Ele e deseja que as nossas escuridões sejam iluminadas pela “sua saliva”, selando, assim uma nova criação.
Cabe, pois nos perguntar como fizeram os fariseus no final do Evangelho: porventura também nós somos cegos? (v. 40). Por que lá na nossa família, não estamos querendo enxergar o meu filho, o meu sobrinho, que está cego nas drogas? Por que não queremos enxergar o meu colega de serviço, a minha colega de serviço, que está no segredo, na escuridão, da infidelidade matrimonial? Por que estou preso nas meras aparências do lucro da minha empresa, do meu consultório, da minha loja e não enxergo o mendigo na calçada de minha casa? a resposta de Jesus à pergunta dos fariseus, também vale para nós: se fôsseis cegos, não teríeis culpa; mas, como dizeis ‘nós vemos’, o vosso pecado permanece (v.41), ou seja, se não tivéssemos ouvido a Palavra de Deus e o seu convite a uma mudança de vida, não teríamos culpas continuarmos na escuridão porque ninguém tinha nos alertado, mas como tivemos a oportunidade de escutá-la permanecer na mesmice será uma decisão pessoal, intransferível e imutável.
POR: Seminarista Wagner Carvalho.